terça-feira, 12 de outubro de 2010

Monólogo:.


Para ler ao som de Coldplay - Fix You.

Na primeira vez em que eu te perdi, senti o céu rasgando e roubando a luz e tudo o que estava guardado dentro de mim. Não o bastante, levou o que eu tinha sob os pés enquanto todos continuaram caminhando da mesma forma.
Esse mesmo céu fez da minha luz algumas lâmpadas aquela noite, mas por ter te perdido já era tão pouca a luz que as lâmpadas só iluminavam como as luzes de natal, distantes como estrelas no escuro. Ao invés de contá-las eu tentei enumerar quantas vezes naquele dia silencioso eu havia dito que te amava, por causa da vontade estranha que tive de dizer várias vezes como se você precisasse ter certeza, como se eu estivesse prestes a nunca mais poder te dizer isso. Eu perdi as contas tentando enumerar desde o primeiro eu-amo-você no café da manhã, quando você riu sem entender por quê eu não dizia só bom-dia como sempre e logo disse eu-também-filha.
As luzes não duraram muito tempo então o dia teve que amanhecer, e vi que ainda havia chão onde os outros pisavam e eu também conseguia caminhar, só estava embaçado, o mar que fiz por onde andei sem enxergar muito bem devido aos olhos inchados.

Eu andei o dia inteiro sem saber se tinha te perdido ou se era mais uma ilusão do dia anterior que havia feito par com o seguinte. Foi então que anoiteceu e me levaram de volta àquela casa confusa com as nossas coisas, mas completamente vazia de mim e de você. As roupas ainda estavam no varal, tão secas e ásperas quanto o enjôo que senti quando enxerguei o chão distante e a vertigem que causava. Ali eu fui retomando o passo onde havia varrido algumas semanas seguintes, mas não consegui contá-las, também não consegui contar a ninguém que tinha te perdido então fiquei em silêncio dentro do silêncio da casa até conseguir dormir e sonhei que você estava bem, em um lugar desconhecido. Seu rosto não estava mais cansado e a cada sorriso o lugar se iluminava. Dali soube que a perda era só minha, talvez você precisasse sorrir pra outras pessoas um dia, apesar de eu achar que seu sorriso era sempre pra mim.
Nas seguintes vezes em que eu te perdi, as roupas no varal também perderam a identidade, o perfume fugiu pela janela e eu não tive coragem de abrir o vidrinho pra te lembrar. Tudo era mais delicado, até a dor de ter um céu costurado e a necessidade de ficar sob o sol pra espantar a frieza que se alojou por uns dias no meu sangue.

Consegui contar a alguém o que acontecera, depois a outro alguém e outro até que se transformasse em história, uma fatalidade de um personagem em terceira pessoa, embora eu continue te perdendo de vista todos os dias, cada dia um pouco mais. Quando procuro, te encontro num álbum, sempre comigo sorrindo ao lado mesmo nas fotos que já estão desaparecendo no tempo. Eu me encontro em você e dou continuidade à história que construímos desde sempre nas nossas conversas que duravam horas e horas, dessa vez sem o interlocutor, meu personagem principal.

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