segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Rascunho de anteano:.

Sempre que termino de ler um livro, tento sair caçando detalhes característicos de cada personagem, dou uma boa observada na descrição – embora prefira decifrar a discrição –, até conseguir formar o dito cujo ali dentro da memória (mesmo quando me aparece uma garça cor néon), em pedaços. Então tenho vontade de perguntar ao autor o que ele acha que pensa o personagem, qual seria o próximo passo se não aquele, o que ele pensou naquela fração de segundo em que narrou um suspiro, cadê o motivo, e as partículas de pó que foram levantadas pelo suspiro?
Após espremer peça por peça, canso. Respiro fundo – e sim, partículas de pó voam ao redor, olho devagar acima, o teto branco... Ainda bem que não sou uma história sendo escrita – e volto a pensar, pensar.

Livrada do livro², comecei a encaixar idéias. Umas e outras desconexas fugiram pela janela, desenhadas na fumaça de um incenso doce, doces, e desaparecendo num reflexo de céu que me invadia através do vidro. Outra me apareceu quando quase entristeci por deixar as anteriores escaparem; procurei umas folhas de caderno, de rascunho, de cartão, e acabei com uns rascunhos de quando, nos intervalos de aulas, ia à biblioteca ou ficava num canto alto do pátio olhando a tarde passar, caderno na mão, os papéis soltos dentro dele, jogando uns pensamentos na tinta pra depois ver se alguma coisa fazia sentido.
Rascunhos de faz-tempo ou sem-data, uns versos copiados, uns parágrafos corridos, um romantismo em que quase não me vejo e que aquela garotinha imediatista de corte de cabelo estranho se empenhava em ter sempre um pouco nos bolsos enquanto falava. Tão reticente... Nesses rabiscos reparei numa coragem meio inconseqüente, na eloqüência da minha pressa de criança, narrada pra ninguém.
Ah, ela sim era eu, agosto e agosto atrás.

Em três destes encontrei uma opinião, uma questão e três pontinhos:
- O (ir)real sentido encontrado é algo doado em nós, por nós, e refletido ao redor...
- O cabível é, na maioria das vezes, tão monótono quanto uma idéia profana de aceitação sem questionamento. Já o que nos cabe através das idéias monótonas serem questionadas é imprescindível...
-Escrevo com uma metade-alma, foco nos olhos e me organizo uns sentimentos; absorvendo aos pulmões um tudo afora e fazendo o inverso caber em si do avesso...

Não lembro se isso foi uma reflexão pós-aula, a partir de algum texto, ou se foi coisa de momento cabeça-dura. Talvez nem tenha escrito tudo no mesmo dia-mês, são folhas diferentes.

Dou um refratário cheio de brócolis com queijo branco gratinado pra quem compreender aquilo ali em menos de dez minutos. :)

[¹. Anteontem, sabe? Então, pra mim tem anteano e ante-anteano também. Vale pra ano passado, retrasado, coisa e tal:.]
[². Livro de bolso, “O Diário Roubado” de Régine Deforges. Dessa história eu esperava até menos detalhes descritivos, mas o drama social ao cubo é interessante:.]